Revista Iberoamericana de Tecnología en Educación y Educación en Tecnología

https://teyet-revista.info.unlp.edu.ar/

Número 33 | Julio - Diciembre 2022
Secretaría de Postgrado - Facultad de Informática - Universidad Nacional de La Plata
ISSN 1850-9959

ARTICULOS ORIGINALES

Implementação de realidade aumentada móvel como meiode engajamento para o aprendizado de anatomia vegetal em tempos de ensino remoto

Implementation of mobile augmented reality as a means of engagement for the learning of plant anatomy in remote teaching times

Lucas Gonçalves da Cunha
Universidade Federal de Santa Maria, Brazil
Felipe Becker Nunes
Universidade Federal de Santa Maria, Brazil

Recepção: 16/11/2021 - Aprovação: 09/06/2022

DOI: https://doi.org/10.24215/18509959.33.e7

Cita sugerida: L. Gonçalves da Cunha, F. Becker Nunes, “Implementação de realidade aumentada móvel como meio de engajamento para o aprendizado de anatomia vegetal em tempos de ensino remoto,” Revista Iberoamericana de Tecnología en Educación y Educación en Tecnología, no. 33, pp. 62-72, 2022. doi: 10.24215/18509959.33.e7

 

Resumo:

Os avanços sobre a introdução e utilização das tecnologias na educação permitem o gradativo favorecimento da mediação entre educandos e os objetos do conhecimento. Na área da anatomia vegetal, a Realidade Aumentada (RA) tem grande potencial, pois oferece aos educandos a experimentação da função de um microscópio a partir de seu smartphone. Nesse sentido, avaliou-se o fato de o aluno estar ativamente envolvido através do seu próprio dispositivo móvel, captando imagens da apresentação e vendo como esta é ampliada, representa um aumento da motivação face à alternativa de projeção sequencial das imagens pelo professor. Para isso, foram consideradas as perspectivas tecnológicas e pedagógicas, tendo sido aplicados questionários pré e pós-teste com duas turmas de ensino superior, totalizando 18 educandos. Com os resultados da aplicação, foi possível perceber que a utilização da tecnologia de RA contribui significativamente para o aumento no engajamento dos alunos e para o entendimento de conteúdos abstratos a partir da sobreposição de cortes anatômicos sobre imagens de partes vegetais macroscópicas.

Palavras-chave: Realidade aumentada, Ensino e aprendizagem de anatomia vegetal, Tecnologias na educação, Ensino remoto.

Abstract:

Advances in the introduction and use of technologies in education allow for the gradual favoring of mediation between students and the objects of knowledge. In the area of plant anatomy, Augmented Reality (AR) has great potential, offering to the students the experiment with the function of a microscope from their smartphone. In this sense, the fact that the student is actively involved through his own mobile device, capturing images of the presentation and seeing how it is expanded, represents an increase in motivation in the face of the alternative of sequential projection of the images by the teacher. For this, technological and pedagogical perspectives were considered, and pre- and post-test questionnaires were applied with two higher education classes, totaling 18 students. With the results of the application, was possible to notice that the use of AR technology contributes significantly to the increase in the engagement of students, as well as the understanding of abstract contents from the superposition of anatomical cuts on images of microscopic plant parts.

Keywords: Augmented reality, Teaching and learning of plant anatomy, Technologies in education, Remote teaching.

 

1. Introdução

Atualmente o homem vive em uma era digital imerso em tecnologias em todos os contextos. Embora nos últimos anos pesquisadores de diversas áreas tenham unido esforços para compreender as possibilidades da inserção das mais diferentes tecnologias na educação, ela tem sido apontada como uma área retardatária na adequação aos novos contextos sociais no que tange o desenvolvimento tecnológico [1].

As explicações para esse descompasso entre o desenvolvimento tecnológico e a educação são diversas e transitam pelos mais variados campos do conhecimento, desde o desenvolvimento de competências em tecnologias da informação e comunicação (TICs) por parte dos professores, custo e contexto da realidade escolar e a recente possibilidade de estudar de maneira robusta os efeitos do uso das tecnologias no cérebro do aprendiz [2]. O aprofundamento na ciência, dos ganhos com o uso das tecnologias e da necessária ampliação do olhar sobre a formação inicial e continuada de professores no que tange a inserção das TICs na educação, leva o homem a novas possibilidades na contextualização do ensino ao tempo em que o sujeito vive.

A Realidade Aumentada (RA) é uma tecnologia em franca expansão após auxiliar o desenvolvimento em áreas como a industrial, da arquitetura e da construção civil, adquirindo maturidade e tornando-se mais robusta a cada ano sendo apontada, por Tori e Hounsell [3], como uma das tecnologias que mais pode beneficiar a mediação entre educandos e os objetos do conhecimento, sendo a popularização de smartphones com maiores capacidades de processamento.

Tori e Hounsell [3] definem a RA como uma tecnologia que permite o enriquecimento do ambiente físico com objetos modelados computacionalmente, oportunizando a coexistência de itens reais e virtuais através de um dispositivo de visualização. Suas principais características são: a combinação de objetos virtuais e reais em um ambiente real; a interação em tempo instantâneo e, por fim, o alinhamento entre o real e o virtual [4].

Considerando os obstáculos que permeiam o ensino sobre as plantas e as possibilidades elencadas na literatura científica para a melhoria da mediação entre educandos e os objetos do conhecimento, a união de esforços entre as esferas técnica, pedagógica e de pesquisa, é essencial para adequação da prática docente aos anseios da chamada “Educação 4.0”, que prioriza atividades com alto grau de criatividade [5].

Diante desse contexto, analisar na perspectiva macro, elementos que influenciam no processo de ensino e aprendizagem tal qual na percepção humana do mundo vegetal, evidenciam-se as necessidades e possibilidades do uso de tecnologias imersivas (como a RA) no meio educacional.

Concebendo as ciências biológicas como tal perspectiva macro, uma das áreas mais negligenciadas é a botânica, considerada como o ensino e aprendizagem sobre os organismos vegetais, tendo os principais obstáculos apontado por Alves [6] quanto “[...] a falta de contextualização dos conteúdos ensinados, nomenclaturas complexas e os procedimentos metodológicos do professor”. Obstáculos que, somados ao contexto social moderno, levaram ao fenômeno conhecido como “Cegueira Botânica”, ou a incapacidade de o homem perceber a dependência humana das plantas [7], estando esses longe de tudo o que é considerado natureza.

Uma vez que o ensino superior exige o aprofundamento das temáticas trabalhadas, lidar com a área da biologia vegetal se torna-se um desafio, visto que esses conteúdos se caracterizam pelo elevado número de nomenclaturas, informações e a complexidade no entendimento de processos biológicos e termos técnicos [8]. Além disso, a abstração necessária para a compreensão de conceitos sobre mundos invisíveis a olho nu pelos estudantes, os quais ou exploram a temática a partir de laboratórios com auxílio de microscópios, ou ficam reféns de imagens 2D, em slides e materiais impressos convencionais no contexto do ensino emergencial remoto, sendo desestimulados e tendo dificuldade na compreensão das estruturas microscópicas.

De acordo com Ursi e Barbosa [9], as dificuldades ao lecionar as grandes cargas de conteúdo botânico precisam ser superadas pela motivação dos alunos através da curiosidade, levando os discentes a uma participação voluntária e prazerosa. Nesse sentido, pode-se aferir que há ganhos no engajamento dos educandos no ensino remoto da disciplina de morfologia vegetal. Além disso, a utilização de recursos com RA foi elencada como uma potencial ferramenta tirando os educandos da zona de conforto, deixando o estado de consumidores diante das telas de seus computadores, passando a ser agentes do seu aprendizado, tendo que agir desde o momento em que o aplicativo é instalado no smartphone e em momentos da aula, sendo necessário acompanhar o andamento do conteúdo através da visualização com o smartphone.

A fim de contextualizar o exposto à realidade imposta pelo distanciamento social, o presente trabalho visa investigar os efeitos da mediação de conteúdos por meio de um recurso com RA em uma turma da disciplina de morfologia vegetal do primeiro período no curso de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Santa Maria.

Assim, o objetivo deste estudo foi desenvolver um recurso em RA para oferecer, ao docente, um método capaz de engajar os universitários que, ao ingressarem no curso, se depararam com aulas por web conferência devido às necessidades impostas pela pandemia. Junto de outros fatores de contexto social, as aulas remotas levaram ao aumento significativo no desenvolvimento de ansiedade, depressão e estresse por parte dos estudantes. De acordo com Nunes [10]:

“não é exagero afirmar que isso pode levar à diminuição da motivação aumentada pela pressão de estudar de forma independente e a interrupção da rotina diária. A consequência será um aumento potencial nas taxas de evasão.”

A adaptação de uma aula expositiva via web conferência para uma aula mediada pela tecnologia em RA demanda uma curva de aprendizagem acentuada que buscou-se reduzir através do processo de construção colaborativa, avançando atentando aos aspectos técnicos e pedagógicos. Além disso, realizaram-se encontros para capacitação e adequação do aplicativo, considerando como marcadores para a RA, imagens existentes em slides que a docente já utilizava para ministrar suas aulas.

Visando a interação por meio dos smartphones, a construção do banco de dados se deu pela plataforma Magipix, que permite a seleção de alvos e de arquivos que serão mostrados em RA. Dessa forma, é necessário que os alunos somente baixem o aplicativo disponível na Play Store ou Apple Store, para então seguir a dinâmica que será abordada no desenvolvimento do presente trabalho.

Assim, o objetivo da presente pesquisa constituiu em oferecer ao professor e aos alunos uma metodologia de mediação diferenciada para ganhos no que diz respeito ao engajamento, uma vez que a evasão dos graduandos na disciplina de Morfologia Vegetal foi uma das problemáticas nos dois últimos semestres em que a disciplina foi ministrada.

Para organizar a linha de pensamento deste estudo, a seção 2 apresenta o estado da arte no que diz respeito às principais esferas relacionadas aos conteúdos abordados, o ensino de morfologia vegetal no período remoto, e a utilização da RA no ensino da biologia vegetal. Na seção 3 é abordado detalhadamente o processo metodológico de execução do estudo, desde as investigações inicias, passando pelo desenvolvimento do software e, por fim, abordados os instrumentos de coleta de dados. A seção 4 apresenta a análise e discussão dos resultados, separando o foco formativo, relacionado à experiência docente em relação à RA, do foco discente, relacionado aos ganhos e percepção discente diante da utilização da RA no período do ensino remoto. A quinta (5) e última seção, apresenta as conclusões sobre a utilização da RA para o ensino de anatomia vegetal, levando em considerações questões como a parceria entre profissionais da área das tecnologias e professores, a inserção permanente e evolutiva dos recursos tecnológicos na prática docente e a valorização dos profissionais da área das tecnologias na educação.

2. Estado da arte

Buscando a adaptação das novas tecnologias na educação, Arslan et al. [11] elaboraram um aplicativo móvel com objetivo de aprimorara a mediação entre educandos e os objetos de estudo da biologia. Na área da Biologia, revisões sistemáticas de literatura apontam que a utilização da RA vem sendo aplicada em situações em que os objetos e eventos não são visíveis, como elementos e processos em escalas reduzidas ou aceleradas, tendo ótimo aproveitamento na visualização de conceitos abstratos e na substituição de equipamentos de alto custo, como os microscópios [12].

O desenvolvimento focado do aplicativo AR é uma etapa essencial para adequar a tecnologia ao contexto da aplicação e aos objetos de estudo. É nessa etapa que ocorre a identificação das necessidades e dos limites para o alinhamento ao cenário e objetivo do professor. Na área da biologia, a literatura científica aponta essa etapa como crucial para ganhos no engajamento dos alunos [11] “[...]what do you think about using biology applications on your mobile phone with AR?”

Embora a literatura aponte ganhos positivos no engajamento e na participação dos educandos, na área da Biologia há uma lacuna relacionada ao desempenho acadêmico; ora pesquisadores salientam, por meio da avaliação entre grupos de controle e experimentais, que a utilização da RA nesse contexto não afeta o desempenho, ora estudos semelhantes apontam ganhos no desempenho [13].

Nesse sentido, [13] apontam ainda que a negativa no desempenho pode estar associada a forma de utilização do recurso “[...] this situation might have been caused by focus on technology rather than content”. Então pode-se aferir que, desde a seleção dos softwares de construção até aplicação, o processo de elaboração da dinâmica do presente estudo foi pensada para simplificar a mediação inicial entre o professor, os educandos e a tecnologia.

Apesar de a literatura apresentar divergências quanto ao ganho no desempenho acadêmico com a utilização da RA, deve-se lembrar que, nesse estudo, devido à realidade do ensino remoto, os ganhos, relacionados ao engajamento e à aprendizagem, tem potencial ampliado pela mediação dos conteúdos de forma diferenciada no cenário possível da interface digital das aulas por web conferência.

2.1. Referencial teórico

Com o propósito de compreender o cenário da relação entre educandos e os conteúdos da anatomia vegetal e as possibilidades e limitações no uso da tecnologia de RA é vital, para o ensino de conteúdos relacionados à Biologia, um olhar histórico sobre os processos que influenciam na elaboração de novas abordagens para a mediação entre discentes e o objeto do conhecimento em questão.

2.1.1. Morfologia vegetal, complexidades e o ensino remoto

O ensino e aprendizagem de botânica gera complexas discussões, visto que o comportamento humano diante de tudo o que pertence ao reino vegetal coloca em dúvida a eficácia do ensino relacionado às plantas, especialmente no sentido de gerar valores positivos, de pertencimento e da própria dependência dos seres humanos para com os organismos produtores.

Em 1999, as autoras James Wandersee e Elisabeth Schussler propuseram o conceito de “Cegueira Botânica”, que se resume pela incapacidade humana em reconhecer a importância das plantas na biosfera e no cotidiano, fenômeno explicado pelas esferas relacionadas à cultura, modo de vida, e a processos neurofisiológicos inerentes aos seres humanos [14].

A primeira esfera se explica a partir da falsa ideia de que os seres humanos não precisam mais conhecer as plantas, conceito esse fixado no subconsciente da espécie humana, que, diferente dos demais animais que selecionam frutos e alimentos dentre opções tóxicas e nocivas à saúde, encontram frutas, grãos e tudo que se relaciona ao mundo vegetal nas gondolas dos mercados, sem a necessidade de reconhecer esses elementos da natureza para garantir a sobrevivência.

Na origem neurofisiológica, a literatura aponta que a percepção visual dos seres humanos prioriza as coisas móveis, com padrões chamativos de cores ou ainda que gerem o sentimento de ameaça. Além disso, há o processamento cerebral das informações visuais relacionadas aos vegetais, condicionamento de valores intrínsecos dos indivíduos, ou a relances de percepção quando floridos ou com frutos [15].

A relevância em conceituar esse fenômeno está nas consequências exercidas sobre o ensino das plantas que, desde a educação básica, perde espaço para outras subáreas da Biologia, como a Zoologia e a Biologia Humana. [16] apontam que “[...]o ensino escolar de botânica em tal contexto pode ser insuficiente para a formação de uma base de conhecimentos e habilidades e para o desenvolvimento de valores positivos sobre as plantas,”.

As sequelas do modo com que o ensino das plantas evoluiu ao longo da história são sentidas por professores do ensino superior que, ao receber os egressos da Educação Básica com pouca ou nenhuma experiência ou aquisição de conhecimentos mais robustos sobre os vegetais, sentem a necessidade de contextualizar e resgatar as bases conceituais da botânica das quais não são necessárias em algumas áreas, como na área da Zoologia.

Colaborando negativamente com a situação, a abordagem inicial da Botânica no ensino superior, mesmo alinhada à prática, caracteriza-se pela grande carga cognitiva intrínseca ao conteúdo robusto em informações e termos técnicos para compreensão de elementos que nem sempre são visíveis a olho nu [6].

Antes mesmo da popularização das tecnologias como a realidade virtual e aumentada, pesquisas na área da botânica enfatizavam a aversão e a falta de engajamento nas aulas destacando, como um dos motivos dessa, a transferência de conhecimentos com pouca ou nenhuma utilização das possibilidades tecnológicas que já faziam parte da realidade dos educandos [17].

Compreender o cenário da migração do presencial para o remoto e o poder do uso das tecnologias para agregar valor emocional à aprendizagem reflete em um professor mais aberto para novas possibilidades de mediação tecnológica. Em 2020, [18] realizaram um estudo sobre a percepção de alunos diante do processo de transição para o ensino remoto. Apesar de os discentes reconhecerem a necessidade emergencial da adaptação, grande parte dos relatos levantam questões relacionadas à atenção e foco, como por exemplo:

“Aulas assistidas como as do ensino remoto...se torna cansativa, diminuindo o rendimento de aprendizagem... esse método não é eficaz, para o discente é bastante complicado se manter centrado tantas horas na tela, ocorre então a falta de estímulo... a questão da concentração é afetada pelo ambiente em que está inserido.”

Ciente das contribuições do diálogo entre a pedagogia e a neurociência e portando conhecimento sobre o funcionamento do cérebro humano diante do processo de aprendizagem, a busca pelo aprimoramento dessas questões no ensino remoto exige a apropriação de possibilidades que considerem os conhecimentos e principalmente aqueles desenvolvidos na área sistêmica e cognitiva, que versam sobre processos como a percepção, atenção, aprendizagem e memória [19].

2.1.2. Realidade Aumentada no ensino da biologia vegetal

Apesar da utilização de aplicativos com RA evidenciarem impactos positivos nos níveis de atenção e concentração dos educandos configurando maior envolvimento na atividade proposta [20], o desenvolvimento e aplicação da RA na educação exige, dos mediadores, o entendimento e superação de alguns obstáculos.

Na área do ensino em ciências, a inexistência de um contato prévio dos educandos e do docente com tecnologias de RA pode levar a complicações relacionadas a fatores tecnológicos e pessoais, dificultando as dinâmicas, gerando inseguranças e questionamentos sobre os benefícios da inserção da tecnologia na rotina da escola.

Os problemas relatados na esfera tecnológica estão relacionados inicialmente com a compatibilidade de aplicativos de RA, com a variedade de aparelhos e suas diferentes capacidades de processamento, passando por questões sobre a interface, por vezes sem orientações e não intuitiva, além da falta de tutoriais em diferentes idiomas. Na esfera pessoal, a inserção das tecnologias de RA na educação precisa transpor a resistência criada pelos docentes, que optam por não sair da zona de conforto de suas aulas, estruturadas e lecionadas em moldes mais convencionais [21].

De acordo com a experiência mostrada em [22] no desenvolvimento de um recurso com RA para a inserção na realidade da sala de aula, sendo ela presencial ou virtual, além de considerar cuidadosamente os desafios expostos acima, a maneira mais eficiente para driblar obstáculos é a identificação do público-alvo. No caso deste estudo aplicado em uma turma do ensino superior durante as aulas remotas, foi identificado que os alunos não evadidos possuíam smartphones, tendo sido possível realizar a instalação do aplicativo e download do banco de dados.

De acordo com [21], relação e experiências prévias dos discentes com as ferramentas de mediação, aqui sendo o smartphone e o notebook, são particularmente interessantes, mesmo que utilizados em outros cenários. No contexto da turma em questão no período de ensino remoto, os discentes estavam extremamente habituados em trabalhar com a interface smartphone-computador para o desempenho das diferentes demandas.

Ainda que, no universo da educação a Biologia seja uma área com inúmeras pesquisas e recursos educacionais com tecnologias de RA, grande parte dos aplicativos criados para dispositivos móveis não apresentam propostas pedagógicas coerentes, uma vez que são elaborados sem o intuito de atender um fim ou público específicos. Dessa forma é indispensável, no desenvolvimento de recursos para a Biologia, considerar fundamentações teóricas pedagógicas embasadas na literatura científica e variáveis específicas do público-alvo [23].

A mediação da grande carga cognitiva intrínseca ao conteúdo de botânica deve se utilizar da RA como ferramenta tecnológica facilitadora, visto que o estímulo necessário para que os alunos iniciem a jornada da investigação dos conteúdos tidos como abstratos na anatomia vegetal pode ser alcançado através de recursos tecnológicos. Uma vez responsável por pegar seu smartphone e apontar para a tela, buscando o reconhecimento de um marcador para a visualização das informações adicionais, o educando começa a se tornar sujeito ativo no processo de ensino e aprendizagem.

Especificamente com relação à microscopia vegetal, o potencial da tecnologia de RA ainda é subexplorado, sendo destacado por [23]:

“[...] o uso educacional dos smartphones pode ainda auxiliar na compreensão e visualização de sistemas complexos, como células e tecidos. Esses aplicativos não só ilustram como se organizam e ocorrem os processos, mas também permitem uma interação com os usuários desses ambientes virtuais de aprendizagem (AVA).”

Além do mais, Lindenmaier [24] também relata que a dificuldade no estímulo está presente em alunos e em professores, que “[...] acabam admitindo a utilização de uma metodologia tradicional baseada na exposição e memorização”. Essa situação que deve ser superada, podendo ser feita com a utilização da RA, seja nos ambientes virtuais com a sobreposição de camadas diretamente na tela dos computadores, seja no ambiente presencial com a sobreposição de modelos e camadas sobre os materiais didáticos.

3. Metodologia

Para o desenvolvimento deste estudo, optou-se pela pesquisa científica aplicada de natureza qualitativa. Sendo o objetivo foi alcançado através das metodologias descritiva e exploratória, considerando a necessidade da visualização das características do fenômeno na inserção da RA na amostra estudada, bem como o estabelecimento de correlações entre variáveis como as possibilidades da RA e conteúdos específicos da anatomia vegetal. A presente pesquisa é de natureza descritiva, ideal para a captura e exploração de cenários e situações [25].

A busca pelo estudo profundo e exaustivo dos fatos e objetos de investigação levou a escolha do procedimento técnico do estudo de caso que permite, de acordo com Yin [26], “[...] uma investigação empírica que investiga um fenômeno contemporâneo dentro do seu contexto da vida real”. A partir desta análise, é possível esclarecer os motivos pelos quais adotou-se determinada metodologia, por que implementar de tal maneira e os resultados frutos das interações. A metodologia foi guiada pelos momentos de investigações iniciais, escolha e desenvolvimento do aplicativo, aplicação do recurso e coleta de dados.

3.1. Investigações iniciais

Nesta etapa foram verificadas, junto ao docente, as potencialidades da aplicação de tecnologias de RA na disciplina de Morfologia Vegetal, sendo selecionados dois objetos de aprendizagem: caule e raiz.

Devido ao fato de o docente não ter contato prévio com a RA, foram realizadas três reuniões em que se explorou a tecnologia, suas possibilidades, os benefícios relacionados ao engajamento principalmente na educação remota, expondo também as dificuldades que poderiam surgir quanto a mediação através do recurso.

Levando em consideração a apresentação das possibilidades e a expertise profissional enquanto docente da disciplina, ele optou pelo desenvolvimento e intervenção nas aulas sobre caule e raiz. Foram levados em consideração dois pontos que conduziram a seleção dos objetos de conhecimento: a dificuldade na assimilação entre o universo microscópico do interior do caule e raiz, assim como a relação com a morfologia externa; e a dificuldade em transmitir de maneira palpável o que no ensino presencial seria feito com plantas reais, microscópio e desenhos no quadro negro.

Por fim, a seleção de conteúdos específicos foi pautada na grande quantidade de possibilidades que poderiam ser transmitidas a partir do reconhecimento de características morfológicas externas como marcadores de RA, sendo proposta a elaboração de recurso em RA com conteúdos microscópicos relacionados à: organização dos tecidos vegetais; interação entre plantas e micorrizas; diferenças anatômicas entre raízes e caules de plantas eudicotiledôneas e mocotoledôneas; diferenças entre raízes de plantas epífitas e parasitas; crescimento secundário do câmbio vascular; e lenticelas.

3.2. Desenvolvimento utilizando software de RA

De posse dos resultados da etapa anterior, foram desenvolvidas, tendo como base os conteúdos elencados pelo docente, as imagens que compuseram a unidade microscópica, ou seja, aquela que foi transmitida na tela do smartphone dos educandos.

Visando uma intervenção mais agradável para o docente, as imagens que serviram como marcadores foram retiradas dos slides em formato .ppt (Power Point), que o mesmo já utilizava para ministrar suas aulas, não sendo necessário uma curva acentuada de adaptação para a aula com um novo material. Ainda na perspectiva da redução de dificuldades na adaptação, foram selecionadas imagens produzidas pela docente e pelos seus bolsistas, não demandando estudo prévio do material.

Após a elaboração da conexão entre os marcadores com características morfológicas vegetais externas e as imagens para a RA com características anatômicas e microscópicas, a dinâmica foi apresentada ao docente que, ciente das necessidades pedagógicas ao lidar com o conteúdo, realizou uma série de observações para o redesigne conforme seus objetivos, as dificuldades discentes e necessidades da mediação da anatomia vegetal.

O aplicativo selecionado para o desenvolvimento foi o Magipix, uma plataforma que permite o desenvolvimento intuitivo de recursos com RA, sendo necessária a conversão dos arquivos para os formatos .png (Portable Network Grapics) e .mp4 (MPEG-4 Part 14), padrões que a plataforma reconhece os marcadores e arquivos para RA respectivamente sendo organizados em uma página web após a conversão, bastando ao criador ter acesso a um computador com internet.

Ao final do presente estudo, foram gerados um banco de dados com o nome “Morfol2021REDE”, o código “lucgo-8504e” e um QR Code, elementos esses utilizados pelos alunos para realizar o download do banco de dados elaborado para a dinâmica.

3.3. Aplicação e considerações docente ao bom desenvolvimento

O recurso em RA foi aplicado em duas turmas do primeiro período na disciplina de Morfologia Vegetal do curso de Bacharelado em Engenharia Florestal da Universidade Federal de Santa Maria. A aplicação aconteceu em dois momentos: o primeiro de forma síncrona com a participação de 18 educandos com idades entre 17 e 24 anos tendo tempo de duração de 3 horas; a segunda ocorreu de forma assíncrona e os educandos puderam, a partir de uma aula gravada pelo professor, continuar utilizando os marcadores e o banco de dados já baixado.

A aplicação iniciou no dia anterior à dinâmica pela comunicação aos alunos com a necessidade de realizar o download do aplicativo Magipix na Play Store ou Apple Store, serviços de distribuição digital da Google e da Apple respectivamente.

Inicialmente o docente apresentou os mediadores da dinâmica, explanando novamente sobre a necessidade do download do aplicativo, pois esse instalado no smartphone seria a ferramenta para visualizar o conteúdo anatômico.

Considerando o ensino remoto, a metodologia BYOD (“Bring your own device”- Traga seu próprio dispositivo) foi a única possível e, apesar de recentes revisões sistemáticas de literatura apontarem que a maioria dos alunos têm seus próprios smartphones [27], resolveu-se elaborar um material de apoio no formato .pdf que poderia ser acessado por educandos que enfrentassem problemas técnicos, possibilitando o acompanhamento da aula a partir de um arquivo convencional.

Tendo em vista a simplificação de download do banco de dados, o QR Code gerado pela plataforma Magipix foi inserido nos slides da disciplina de Morfologia Vegetal. Houve uma intervenção no instante que o QR Code foi projetado, tendo sido explicada a dinâmica e a utilização do smartphone como forma de simular a utilização e função de microscópio. A Figura 1 mostra o ambiente virtual da sala de aula via Google Meet e o slide com QR Code para acesso ao banco de dados.

QR
Code no ambiente virtual da sala de aula
Figura 1. QR Code no ambiente virtual da sala de aula

Um dos questionamentos levantados pela docente foi quanto a identificação das imagens marcadores, visto a grande quantidade de slides indispensáveis pela carga intrínseca ao conteúdo, somando 56 slides onde foram distribuídos os marcadores. Foi utilizada, para a superação deste obstáculo, uma estrela preta no canto inferior direito identificando todas as imagens para as quais o banco de dados fornecia elementos anatômicos em RA. A Figura 2 apresenta exemplos de marcadores após o redesigne de acordo com a necessidade docente.

Marcadores
com estrela para identificação de RA
Figura 2. Marcadores com estrela para identificação de RA

A Figura 2 apresenta, da direita para a esquerda, os marcadores que mostraram a organização das células e tecidos, a diferença anatômica entre raízes de eudicotiledônea e monocotiledônea, e as questões relacionadas ao crescimento secundário do câmbio vascular.

Como forma de guiar a dinâmica dando foco para a mediação do conteúdo pela docente e não à tecnologia, a intervenção pelos organizadores limitou-se a primeira aparição de um marcador, onde foram realizadas perguntas para sanar problemas técnicos quanto ao download do aplicativo, acesso ao banco de dados e leitura do primeiro marcador, que pode ser observado na Figura 3.

Primeiro
slide para interação em RA
Figura 3. Primeiro slide para interação em RA

A Figura 3 mostra o primeiro slide com conteúdo correspondente em RA. A primeira imagem traz o slide completo com uma das figuras marcadas com a estrela preta no canto inferior direito informando aos docentes e discentes a existência de informações microscópicas em RA. A imagem a direita apresenta uma simulação da dinâmica do respectivo slide, onde o aplicativo reconhece a assinatura do marcador e sobrepõem uma camada virtual ao slide com informações microscópicas sobre as micorrizas.

3.4. Instrumentos de coleta de dados

Com a finalidade de verificar a percepção dos atores envolvidos na mediação dos conteúdos com o recurso tecnológico em RA, os dados foram coletados por meio de questionários pré e pós-teste, elaborados no Google formulários e aplicados com o docente e com os discentes de duas turmas de Morfologia Vegetal.

O questionário aplicado ao docente foi elaborado com questões abertas e de livre resposta, orientadas ao “concordo plenamente” e “discordo totalmente”, sendo os principais objetivos a ciência sobre os conhecimentos prévios e experiência docente com a tecnologia RA, além das expectativas e anseios da utilização na perspectiva do conteúdo específico.

Aos discentes, o questionário, também composto por questões abertas e com opções de “concordo” e “discordo”, objetivou-se o retorno sobre aspectos técnicos e de afetividade como: facilidade no uso, contribuição para compreensão dos conceitos, melhoria na dinâmica se comparada a aula expositiva via web conferência, e utilização do recurso em outras aulas e conteúdos no período de ensino remoto.

Além desse material, durante a realização da atividade síncrona foram tomadas notas de campo para a realização de análises a fim de relacionar o observado com as perspectivas docente e discente.

4. Análise e discussão dos resultados

Para caracterizar e explorar a percepção dos atores envolvidos no processo de ensino e aprendizagem relacionado a esta experiência foram analisadas qualitativamente as respostas do docente em relação à utilização do recurso, e qualitativa e quantitativamente as respostas dos discentes em relação à utilização da RA na educação, no contexto da disciplina de Morfologia Vegetal e no período de ensino remoto.

4.1. Enfoque formativo

A articulação entre teoria e prática demandou a realização de três reuniões com o docente, tendo sido utilizadas simulações sobre o uso da RA para levar, aos discentes, a experiência do microscópio. Apesar de se expor em três reuniões, a curva de aprendizagem demandou a realização e resolução de inúmeros encontros e questionamentos informais durante a seleção dos conteúdos e elaboração das imagens do banco de dados. Na literatura científica, a curva de aprendizagem a ser despendida para a elaboração desse tipo de tecnologia é apontada como um dos motivos para a rejeição e dificuldade da implementação na área educacional [20].

Após o envio das respostas pelo docente, os resultados levantados apontaram que esse não tinha qualquer experiência prévia com tecnologias de RA, sendo essa inexperiência um ponto fundamental a ser considerado para uma boa relação entre o docente e a tecnologia, pois indicou a necessidade de uma abordagem de mediação inicial adequada entre a tecnologia de RA e um docente sem conhecimentos prévios não só nas possibilidades de utilização da tecnologia quanto à disciplina em questão, mas também quanto ao funcionamento da tecnologia em si.

Embora sem experiência prévia e nunca tendo considerado a utilização de tecnologias em RA para o planejamento de aulas, as respostas do docente ao questionário mostraram que esse acreditava que a interação seria satisfatória. O questionário foi aplicado após a primeira reunião formal, tendo sido apresentados, ao docente, o funcionamento da tecnologia e as possibilidades para trabalho na área da Morfologia Vegetal.

Considerando os apontamentos realizados por [18] sobre os motivos que levam a evasão em tempos de ensino remoto e avaliando a participação da turma nos encontros síncronos, o docente respondeu que acredita no uso dessa tecnologia como meio para engajar os educandos na participação dos encontros ao vivo. É importante destacar que, dos 35 alunos matriculados em duas turmas, somente 16 participavam de forma ativa das aulas e no desenvolvimento das atividades.

Diante do objetivo da presente pesquisa e da sincronia com apontamentos feitos por [11] quanto a necessidade de alinhamento da tecnologia aos objetivos e métodos do docente, uma pergunta aberta foi adicionada ao questionário com a finalidade de descobrir qual a expectativa do docente em relação a RA no contexto do ensino remoto da Morfologia Vegetal. Foi elencada, pelo docente, a necessidade de um material para complementar o conteúdo sobre anatomia vegetal das estruturas macro que seriam apresentadas em aula.

Por fim, verificou-se que o docente acredita no potencial da inserção de recursos com RA na educação, não apenas no período remoto, mas também em aulas presenciais, visto que aparelhos com o microscópio nem sempre estão disponíveis ou são utilizados no primeiro semestre do ensino superior.

4.2. Enfoque discente

Com relação aos alunos, mesmo tendo material de apoio, nenhum discente relatou, no momento síncrono, dificuldade em realizar o download do aplicativo ou acessar o banco de dados. A plataforma Magipix permite que o mediador da atividade acesse o número de usuários que realizaram o download do banco de dados, verificando 16 instalações em uma turma com 18 participantes, número elevado perto do esperado e das variáveis como a disponibilidade de um smartphone com memória e processamento básicos, além da vontade em participar de forma voluntária, uma vez que não havia possibilidade de controlar a dinâmica com os discentes da web conferência.

Considerando o período remoto, em que a evasão e a pouca participação dos discentes nas atividades síncronas são realidades presentes no cenário cotidiano, a instalação do aplicativo e download de forma voluntária por 89% dos participantes do momento síncrono, retratam o potencial da utilização da tecnologia de RA no aumento do engajamento dos discentes diante da atividade.

Sob o mesmo ponto de vista, durante a coleta de dados pós-utilização do recurso com RA, 78% dos discentes participantes responderam de forma voluntária ao questionário, indo além das respostas mais básicas, “concordo e discordo”, contribuindo com considerações sobre a experiência na utilização do aplicativo, os anseios no aprofundamento das temáticas e a organização dos conteúdos no banco de dados.

Após a utilização do recurso em RA, foi realizada a aplicação do questionário, sendo que os resultados foram discutidos conforme os aspectos técnicos e afetivos.

Quanto a usabilidade do produto, 86,7% dos alunos concordaram plenamente sobre a facilidade na utilização do recurso tecnológico e 14,3% discordaram. Como forma de complementação, na segunda pergunta, aberta e de livre resposta, foi questionado quais as dificuldades em caso de discordância quanto a facilidade no uso. O aluno identificado como A3 relatou:

“[...] O acesso a informação no aplicativo”. (A3)

Uma vez que o questionário foi respondido anonimamente, não foi possível identificar o discente para maiores questionamentos, tampouco foi identificado qual fator técnico causou a dificuldade ao educando pois, ao abrir o aplicativo no smartphone, são exibidas uma sequencia de telas com tutoriais, textos e setas que indicam como fazer a leitura do QR Code ou a inserção do código para o download do banco de dados.

Ainda no que diz respeito à facilidade no uso, um dos alunos comentou uma série de pontos que serão discutidos a seguir:

“[...] A necessidade de explicar as setas/legendas nas fotos do App. Confuso a parte de raiz de mono e eudico porque no slide estava em uma sequência e no App estava em outra. A escala utilizada na foto das micorrizas”. (A8)

Quanto à necessidade de explicar as setas, o problema está relacionado ao grau de aprofundamento das abordagens em determinados momentos. A Figura 4 mostra o slide em que foram apresentadas as informações sobre crescimento secundário do câmbio vascular e a informação correspondente em RA.

Slide e imagem da RA, abordagem
crescimento secundário
Figura 4. Slide e imagem da RA, abordagem crescimento secundário

As setas apresentadas na imagem que mostra o corte anatômico apontam para diferentes estruturas do caule da planta que, como já explicado nesta pesquisa, demandam a compreensão de complexos conceitos de morfologia vegetal. Uma vez que o encontro síncrono teve o tempo máximo estipulado em três horas e considerando o objetivo da docente em complementar o conteúdo sobre anatomia vegetal, algumas abordagens planejadas tiveram que ser vistas brevemente, estando o aluno com razão em relação à complementação em relação a setas e legendas.

Para compreender o relato do aluno sobre a confusão quanto à monocotiledônea e eudicotiledônea, a Figura 5 deve ser observada.

Marcador e imagem RA para abordar
diferença nas raízes
Figura 5. Marcador e imagem RA para abordar diferença nas raízes

Mesmo atentando-se ao aspecto pedagógico na elaboração do material, este ponto acabou passando e gerando confusão para um aluno. No slide, a arquitetura das raízes é apresentada na sequência eudicotiledônea>monocotiledônea, porém, ao fazer a leitura do marcador, a imagem correspondente inverte essa ordem, ficando sobreposta à imagem invertida.

Ainda neste relato, o aluno A8 sentiu falta da escala na captura das imagens. Considerando o objetivo docente em complementar a aula, a limitação de tempo e a existência de outras disciplinas no decorrer do curso que abordam de forma específica a microscopia como a anatomia da madeira, a escala não é tão relevante para o foco do material e do objetivo da disciplina, uma vez que a questão será trabalhada intensamente nas disciplinas subsequentes.

Porém a dúvida do aluno nunca deve ser desconsiderada, sendo a resolução proposta através da abordagem das questões em um vídeo gravado e disponibilizado de forma assíncrona.

Foram feitas perguntas sobre a contribuição do recurso tecnológico na compreensão dos conceitos e da relação entre as partes macro e micro do vegetal, obtendo-se 100% das respostas como “concordo plenamente”. Discordando de outras práticas envolvendo botânica e tecnologias como a pesquisa realizada por Costa et al. [28] em que conteúdos de botânica foram gamificados, 10% dos educandos relataram não ter ganhos significativos quanto à compreensão dos conteúdos. Nesse sentido, é importante considerar que a pesquisa citada foi aplicada no nível secundário com recursos pedagógicos tradicionais, podendo essas diferenças influenciar no contraste observado na compreensão dos conteúdos.

Na perspectiva da afetividade, as perguntas foram elaboradas no sentido de captar a percepção quanto à melhoria na dinâmica e utilização da tecnologia de RA em outros tópicos e disciplinas. Nesse quesito houve unanimidade, sendo 100% das respostas “concordo plenamente”, ponto que assemelha-se a outras práticas relatadas na literatura científica como em Ribeiro et al. [29], onde a tecnologia de RA foi utilizada para explicar conceitos de campo magnético e 55% concordaram e outros 45% concordaram plenamente que o recurso dinamizou as aulas.

Uma diferença pode ser observada na pergunta sobre a utilização de recurso semelhantes em outros tópicos e aulas sendo que, na pesquisa citada [29], 68% dos alunos concordaram e 27% concordaram totalmente com a utilização da tecnologia em RA em outros tópicos, sendo que 5% dos educandos discordaram com a utilização de recursos semelhantes em outros trópicos, já nesse estudo, as repostas foram positivamente unânimes.

Apesar dos pontos abordados, as turmas demostraram-se satisfeitas com a utilização do recurso, conforme pode ser observado nos relatos que seguem:

“[...] Obrigado pela aula, parabéns”. (A2)

“[...] Obrigada pela aula, foi show!”. (A5)

“[...] Genial, adorei, Abraços”. (A8)

A velocidade com que a educação teve de se adaptar ao ensino emergencial remoto somado ao aumento das demandas de professores e alunos, fez com que a perspectiva da afetividade fosse deixada em segundo plano. Nas aulas do ensino superior, não é difícil presenciar encontros em que os educandos passem todo o período síncrono sem ligar as câmeras, sendo representados por letras ou fotografias.

Durante a aplicação deste recurso, foi solicitado que os educandos abrissem as câmeras. Uma vez abertas, foi possível perceber que os alunos sorriram na medida em que o banco de dados era sobreposto às informações nos marcadores na tela do computador. Ponto relevante que mostra a excitação diante de uma nova forma de acesso à informação transmitida no encontro síncrono.

Observar os educandos apontando seus smartphones para a tela na busca pelo reconhecimento dos marcadores de RA é perceber um aluno participando de maneira significativa da aula, observar o sujeito ativo na construção do seu próprio conhecimento, principalmente se comparado a uma aula expositiva por web conferência, em que os alunos são receptores do conhecimento.

Conclusões

Os resultados obtidos com a aplicação do recurso com Realidade Aumentada foram satisfatórios quanto às expectativas e planejamento. Foi possível realizar diversas reflexões sobre as diferentes etapas que envolvem a inserção da tecnologia de RA na educação, especialmente relacionado à botânica, morfologia vegetal e anatomia vegetal.

Quanto ao engajamento, a participação ativa dos voluntários desta pesquisa (discentes e docente), seja na elaboração do aplicativo com RA, na organização da prática e nas contribuições por meio dos instrumentos de levantamento de dados, certifica que a utilização de metodologias diferenciadas como a RA na lida de conteúdos de anatomia vegetal durante o ensino remoto, gera frutos positivos na participação dos educandos nos momentos síncronos.

Na mesma perspectiva, a possibilidade de conferir o número de download na plataforma Magipix, permite aos mediadores certificar que os educandos participaram de forma ativa na construção do conhecimento. Diferente das metodologias tradicionais de aulas expositivas por web conferência, cada registro de download dos dados requer que o aluno tenha baixado o aplicativo, aberto a câmera e completado as etapas para a visualização da RA em seu smartphone. Sendo viável constatar que os educandos, além da percepção visual, utilizaram habilidades relacionadas à tecnologia, bem como, habilidades motoras para visualização das imagens microscópicas a partir da tela do smartphone.

Além disso, pode-se comprovar a eficácia na parceria entre profissionais com formação tecnológica e de conteúdos e pesquisa. Na perspectiva das licenciaturas, bem como nos semestres iniciais do ensino superior, a utilização da tecnologia de RA pode ser uma excelente ferramenta para instigar os alunos na participação mais ativa das aulas, principalmente naquelas que acontecem por meio das web conferências.

Oferecer aos educandos a possibilidade de utilizar o smartphone para visualizar informações adicionais diretamente sobre a tela dos computadores significa inicia-los na perspectiva do ensino por investigação. Porém, a introdução da RA na educação só obtêm êxito se as esferas tecnológica e pedagógica trabalharem em conjunto na construção do material e na mediação, importando risco de a atividade ser lançada à perspectiva do entretenimento.

Mesmo com a possibilidade de desenvolvimento e do longo período em ensino remoto, a inserção das tecnologias na educação ainda é rara, sendo essa experiência o primeiro contato que os educandos da amostra tiveram com uma tecnologia diferente das aulas expositivas por web conferência, denotando a importância de capacitações e da formação continuada de professores, que também são responsáveis pela adequação aos anseios de educandos que possuem vivências mediadas por meio das tecnologias.

Por fim, como limitação e perspectiva futura para a área deste estudo e da pesquisa da inserção das tecnologias em geral na educação, deve-se atentar para a inserção permanente e evolutiva dos recursos tecnológicos na prática docente. Em relatos de campo, bem como na literatura, pode-se observar inúmeros casos, relatos de experiência e atividades envolvendo tecnologias nos mais variados níveis de ensino. Porém a utilização das tecnologias é limitada ao momento da intervenção, não ganhando robustez significativa a ponto do o docente, por exemplo, utilizar uma tecnologia semelhante com as turmas posteriores.

Fato que explica-se pela baixa capacitação tecnológica, como horizonte utópico resolutivo, a inserção dos profissionais das áreas das tecnologias educativas nos ambientes escolares e de ensino superior. No Brasil, diferentes programas de graduação e pós-graduação formam profissionais habilitados nas áreas da computação e das tecnologias na educação. Dessa forma, tem-se conhecimento e poder para tornar o ensino mais adequando aos estudantes do agora e do amanhã, bastando utilizar o valorizar a produção dos conhecimentos na área das tecnologias na educação.

Referencias

[1] T. A. W. Bates, Educar na era digital. São Paulo: Artesanato Educacional, 2017. Disponível em: http://www.abed.org.br/arquivos/Educar_na_Era_Digital.pdf.

[2] A. L. Rodrigues, “Dificuldades, constrangimentos e desafios na integração das tecnologias digitais no processo de formação de professores,” in Atas do III Congresso Internacional das TIC na Educação, Universidade de Lisboa, 2014, pp. 838-846, doi: https://doi.org/10.14210/contrapontos.v18n4.p354-373.

[3] R. Tori, M. S. Hounsell, Introdução a realidade virtual e aumentada. Porto Alegre: Editora SBC, 2018.

[4] R. Azuma et al., “Recent advances in augmented reality,” IEEE Computer Graphics and applications, vol. 21, no. 6, pp. 34-47, 2001. doi: 10.1109 / 38.963459.

[5] E. F. Oliveira, “Ensino de geografia e educação 4.0: caminhos e desafios na era da inovação,” Revista Amazônica sobre Ensino de Geografia, vol. 1, no. 1, pp. 62-72, 2019.

[6] R. M. Alves, “Ensino de botânica na educação superior: investigação e análise dos obstáculos no processo ensino-aprendizagem em instituições públicas do Amapá, Brasil,” M. S. tese, Universidade Federal Rural da Amazônia, Belém, PA, 2020.

[7] J. Wandersee, E. Schussler, “Towards a theory of plant blindness,” Plant Science Bulletin, vol. 47, no. 1, pp. 2-9, 2001.

[8] E. Melo et al., “A aprendizagem de botânica no ensino fundamental; dificuldades e desafios,” Scientia Plena, vol. 8, no. 10, pp. 1-8, 2012. Disponível em: https://www.scientiaplena.org.br/sp/article/view/492/575.

[9] S. Ursi, P. P. Barbosa, “Fotossíntese; abordagem em curso de formação docente continuada oferecido na modalidade Educação a Distância,” Revista da SBEnBio, vol. 7, no. 7, pp. 198-208, 2020. Disponível em: http://botanicaonline.com.br/geral/arquivos/@Ursi%20e%20Barbosa%202014%20ENEBIO.pdf.

[10] R. C. Nunes, “Um olhar sobre a evasão de estudantes universitários durante os estudos remotos provocados pela pandemia do COVID-19,” Research, Society and Development, vol. 10, no. 3, 2021, doi: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i3.13022.

[11] R. Arslan, M. Kofoglu, C. Dargut, “Development of augmented reality application for biology education,” Journal of Turkish Science Education, vol. 17, no. 1, pp. 62-72, 2020, doi: 10.36681/tused.2020.13).

[12] A. Nesterov et al., “Augmented reality in engineering education: Opportunities and advantages,” Communictions-Scientific letters of the University of Zilina, vol. 19, no. 4, pp. 117-120, 2017. Disponível em: http://komunikacie.uniza.sk/index.php/communications/article/view/280.

[13] C. Erbas, V. Demirer, “The effects of augmented reality on students’ academic achievement and motivation in a biology course,” J Comput Assist Scientia, vol. 35, no. 3, pp. 450-458, 2019, doi: https://doi.org/10.1111/jcal.12350.

[14] J. Wandersee, E. Schussler, “Preventing plant blindness,” The American Biology Teacher, vol. 61, no. 2, pp. 284-286, 1999.

[15] A. Salatino, M. Buckeridge, “Mas de que te serve saber botânica?,” Estudos Avançados, vol. 30, no. 87, pp. 177-196, 2019, doi: https://doi.org/10.1590/S0103-40142016.30870011.

[16] A. Neves, M. Bundchen, C. P. Lisboa, “Cegueira botânica: é possível superá-la a partir da Educação?,” Ciênc. Educ., vol. 25, no. 3, pp. 745-762, 2019, doi: https://doi.org/10.1590/1516-731320190030009.

[17] M. F. F. Garcia, “Repensando a botânica,” in Coletânea do 7º Encontro Perspectivas do Ensino de Biologia, São Cristóvão, SE, 2016, pp. 87-102.

[18] M. C. Feitosa, “Ensino remoto: o que pensam os alunos e professores?,” in V Congresso sobre Tecnologias na Educação, João Pessoa, PB, 2020, doi: https://doi.org/10.5753/ctrle.2020.11383.

[19] M. G. R. Grossi, S. D. B. Borja, “A neurociência e a educação e distância: um diálogo necessário,” Tempos e Espaços em Educação, vol. 9, no.19, pp. 87-102, 2016, doi: https://doi.org/10.20952/revtee.v9i19.5598.

[20] F. Herpich, “Atividade cerebral no uso de recursos educacionais em realidade aumentada: uma análise da atenção do aprendiz,” in Anais do XIXX Simpósio Brasileiro de Informática na Educação (SBIE), 2018, doi: http://dx.doi.org/10.5753/cbie.sbie.2018.1858.

[21] M. Akçayir et al., “Augmented reality in Science laboratories: the effect of augmented reality on university students’ laboratory skills and attitudes toward,” Computers in Human Behavior, vol. 57, pp. 334-342, 2016, doi: http://dx.doi.org/10.1016/j.chb.2015.12.054.

[22] L. Araujo, “DoctorBio: um estudo de caso sobre a utilização de recursos de realidade aumentada no ensino de ciências biológicas,” in Anais do XXIII Workshop de Informática na escola (WIE), 2017, doi: 10.5753/cbie.wie.2017.294.

[23] A. C. Silveira, “Proposta de material didático virtual para o ensino de botânica,” M. S. tese, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, 2019.

[24] D. S. Lindenmaier, “Herbários digitais: uma experiência no ensino de botânica através da arborização e tecnologias de informação e comunicação (TIC)” Vivências, vol. 13, no. 24, pp. 227-235, 2017.

[25] S. C. Vergara, Projeto e relatórios de pesquisa em administração. Rio de Janeiro: Atlas, 2020.

[26] R. K. Yin, Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, 2001.

[27] Lopes et al., “Inovações educacionais com o uso da realidade aumentada: uma revisão sistemática,” Educação em Revista, vol. 35, 2019, doi: https://doi.org/10.1590/0102-4698197403

[28] E. A. Costa, R. A. Duarte, J. A. Gama, “A gamificação da botânica: uma estratégia para a cura da “cegueira botânica”,” Revista Insignare Scientia, vol. 2, no. 4, pp. 79-99, 2019, doi: https://doi.org/10.36661/2595-4520.2019v2i4.10981.

[29] A. A. S. Ribeiro, A. B. O. Siqueira, S. H. Macedo, “Realidade aumentada aplicada ao ensino e aprendizagem do campo magnético de um ímã em forma de ferradura,” Novas Tecnologias Educação, vol. 11, no. 3, 2013.

Autor notes

Lucas Gonçalves da Cunha

Aluno de Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Tecnologias Educacionais em Rede (UFSM/Brasil).

Felipe Becker Nunes

Doutorado em Informática na Educação (PPGIE/UFRGS/Brasil). Mestrado em Ciências da Computação (PPGI/UFSM/Brasil).